Friday, June 29, 2007

Conto I

Conto I
(Nayguel Cappellari)


- Diga doutor, o que é que eu tenho?
- Não posso dizer, meu caro, não sei explicar... mas me parece que suas células estão por conta própria e estão reagindo de forma diferente aos medicamentos. Elas estão sofrendo mutações a cada novo combate de seus leucócitos.
- Ahn, pode me explicar melhor isso? Não entendi nada.
- É, suas células estão sofrendo mutação, meu caro... não sei onde isso pode parar, tal qual um câncer ou qualquer outra doença do mesmo nível de perigo. Acho que não posso fazer mais nada.
- Nada, doutor?
- Nada. Talvez possa te dar uma boa leitura para desfrutares... se voltares aqui em uma semana e assim permanecer, acho que não tens mais volta... E terás de deixar o mundo, sabe, não quero te enganar, mas já te deseganando... acho que se for uma doença grave, estás ferrado!
- Tudo bem, entendi... já tenho meus cinquenta e dois anos... estou bem para ir. Mas então, o que recomendas ler, doutor.
- Alex, a gente se conhece faz muito tempo, acho que temos uma amizade complexa de trezentos anos, não? Sim, simbolicamente falando, óbvio. Mas eu por te conhecer, creio que gostarás de ler isto.
E o doutor entrega o livro a Alex.
- "Poesias de um observador inacessível", nossa, que título! Este livro, trata-se de poesias?
- Não, ele tem poesias, mas não é esta a história. Leve-o, entenderás quando terminares de ler.



E Alex foi para casa.



Chegando em casa, o altivo senhor sobe as escadas... lembra de sua casa antigamente. Com seus três filhos, os dois homens e a caçula. Pensa na sua esposa com quem fora casado trinta e dois longos anos, com apenas brigas sem necessidade, e a qual nunca se separou até o dia da sua morte, por causa da leucemia.
E Alex, vai até o espelho, lembra-se de quando ensinou ao seu primeiro filho como se deveria fazer a barba, lembra quando carregou seu outro filho nas costas quando este se machucou enquanto jogava futebol. Lembra-se de sua filha linda, na festa de quinze anos. Ele tinha orgulho dela, a menina era perfeitamente linda e, quando dançava a valsa no salão parecia que eram os deuses que lançavam suas harpas alegres e seus dançarinos flutuantes para dançar.
E ele anda mais um pouco, tenta lembrar-se dos barulhos que faziam as crianças, mas não consegue... A casa tão vazia... deveria fazer uns trinta anos que os filhos haviam saído.
O primeiro filho tornou-se prefeito e é atarefado demais para conversar com o pai. O segundo filho joga futebol na Inglaterra, mas não esquece do pai. Telefona todas as noites para desejar boa noite e pedir a benção.
A filha caçula está casada, muito bem casada, com um empresário rico. Mas ela também não tem tempo para ele. Organiza eventos sociais e chás-de-bebê com suas amigas desocupadas.
E o velho senhor vai até o quarto de sua amada... onde viveu anos e anos com ela. Olha as roupas no armário e os álbuns de fotos. Deita-se sobre a cama, e dorme. Dorme, dorme...
Quando acorda, já não entende mais nada.
Acorda e está todo suado, parece que está com febre, mas não sente dor alguma. Nem sequer mal-estar.
E Alex vai até o banheiro e olha-se no espelho. Seus olhos estão azuis... e ele nunca teve os olhos azuis, nunca.
Suas mãos estão inchadas e seu rosto está maior. Sua barba cresceu assustadoramente e não tem mais aquele tom grisalho de antes. Agora tem o tom de outrora. Tem o tom loiro de seus lindos cabelos. E ele volta a ter cabelos loiros...
o que está acontecendo? O médico falara que ele estaria morrendo... mas o que houve com ele? Rejuvenesceu sem sentido? Por quê?
E ele então ouve um barulho estranho... e vai ver o que é.
Ele vai até a cozinha e vê sua esposa sentada na cadeira, onde sempre ficava quando tomava seu chá. E ela estava ali, tomando o mesmo chá que muitas vezes ele levava para ela na cama. E ela olhava para ele e sorria.
E ele não continha as lágrimas. Chorava, chorava. Sua esposa viera lhe visitar.
Ele a abraçou. Ela falou algo mas ele não a ouvia. Ele a abraçou e fechou os olhos. Sentiu o calor de seus braços e quando abriu os olhos ela já não estava ali.
Então Alex foi até a rua, pegou o carro, saiu para dar uma volta. Deixou o carro estacionado no shopping e entrou. Começou a caminhar, pensar e caminhar. Sentiu-se mal e não conseguiu olhar mais nada. Fechou os olhos e deitou.
Acordou em um leito de hospital, na UTI. O médico o atendia.
- O que aconteceu?
- Ele acordou! Como?
- O que aconteceu? Alguém me explica?
- Meu bom homem, o senhor estava caído no chão de um shopping, a segurança de lá ligou para nós e fomos buscá-lo. Não entendemos o que aconteceu. O seu organismo não funciona como o de qualquer um. Não sei como o senhor desmaiou nem porquê, e nem sei o que o senhor tem.
- Ih, essa história de novo?
- Como?
- Um médico me consultou, e me disse o que eu tinha... era estranho mas era que minhas células eram mutantes. E que talvez eu teria pouco tempo de vida.
- Exatamente... mas como pode se recuperar assim?
- A força, meu amigo, a força.
- Que força?
- A força de eu encontrar meu amor de novo.

E de lá saiu Alex, mais uma vez renovado, rejuvenescido.
Voltou para casa. Chegando lá pega o livro "Poesias de um observador inacessível" e começa a ler.
Adentra a tarde lendo, e a noite. E a madrugada.
Termina de ler.
E quando acorda no outro dia já está melhor. Pensa que sua vida é uma droga, mas se conforma com ela, assim como o próprio observador inacessível no livro, ele tem suas dores mas não consegue fazer pará-las... E ele pensa. Pensa, pensa.
Mas o homem não consegue deixar de lembrar de sua vida... e lágrimas escorrem, sem algum motivo. Só escorrem.
O homem então, deita-se para tentar descansar... e no outro dia ouve barulhos.
E ele vê seus filhos correndo pela casa, jogando video-game. A caçula brincando de boneca com a mãe... E ele torcendo para os filhos no joguinho de futebol que eles jogavam. E nisto, ele pode ouvir o barulho. Nossa, como eram gostoso.
E então ele vê que seu filho do meu vai para o quarto. Alex o segue. No quarto o filho começa a fazer umas coisas, escreve alguma coisa em um papel e, de baixo da cama, tira um presente, o menino junta tudo e vai até o pai, que estava no quarto, preparando umas contas para a sua empresa. O pai então olha o presente, vê o barulho que fazia. E o filho sorri. O homem então abre, e ali tem um álbum de colagem dos jogadores de futebol. O homem olha, está completo. Ele então sorri, abraça o filho e o agradece. O filho sai feliz.
O homem não se lembrava mais disto, talvez por não querer se lembrar, já que logo em seguida seu filho sairia de casa para jogar na capital de seu estado. E que, logo em seguida seu outro filho teria um filho também. E, com uma cidade para administrar e com um filho para ensinar a crescer o pai ficou de lado.
E a filha, tão linda e vistosa, ele jamais se esquecerá... mas ela também não liga para ele.
Triiiim, o telefone toca e traz Alex para o mundo de novo.
- Alô? Quem é?
- Pai, oi pai, tudo bom?
- Meu filho! Que saudade! Eu tô ótimo. E tu, como estás?
- Muitíssimo bem, meu velho! Estou te ligando para avisar. Estou saindo da Inglaterra, vou ser transferido para um time na Espanha, quando chegar lá eu te ligo, tá bem?
- Meu filho, que felicidade! Espero que tudo dê certo para ti. De verdade, meu menino. Sabe, hoje me lembrava de quando te levantava quando tu caias nos jogos de futebol. Hoje és um homem. Um excelente jogador!
- E eu devo tudo isto graças a ti, meu velho.
- Obrigado, filho!
- Não, pai, eu que te agradeço. Quero te chamar para vir morar comigo. Meu filho está para nascer, e a minha esposa precisa de companhia. Vem pai?
- Eu? Morar contigo? Filho? Eu vou ser avô? - ele mal conseguia falar, as palavras balbuciadas eram simplesmente fracas com o olhar de felicidade do homem.
- Sim, tu morarás comigo, sim, meu filho está para nascer. E darei o nome dele de Alex em homenagem ao senhor, que foi vital para mim.
- Meu filho, obrigado.
- A benção meu pai! Tenho de sair agora... e dormir, treinamento duro pela manhã.
- Deus te abençoe meu filho!
Desliga-se o telefone.
E o homem chora. Chora. Chora, de felicidade. De angústia. De medo.
Deitar-se-á, até que chegue no outro dia.
E quando o sol se levanta ao horizonte, o homem vai até o espelho e olha para si. Ele está cada vez mais diferente. Agora não são mais nem os olhos e nem os cabelos que mudaram. Desta vez foi o corpo, levantou, não é mais encurvado. E ele não pára para pensar e começa a fazer as malas.
O telefone toca...
Triiiiiiiiim.
- Por favor, com gentileza, o senhor Alex Pinheiro se encontra?
- É ele, quem gostaria?
- Aqui quem está falando é Bruno, eu sou o responsável por recados do time Britânico Manchester United, e tenho de te dizer uma coisa, peço que o senhor se sente que é pro seu bem.
- O que aconteceu? Meu filho está contigo?
- É sobre ele que quero falar. Seu filho sofreu um acidente... um torcedor invadiu o treino e deu um tiro no seu filho.
Estalo. Estalo. A cabeça gira, Alex não consegue mais ouvir.
- Cadê ele? Eu quero meu filho!
- Eu sinto muito, ele foi levado para o pronto socorro, mas não conseguiu sobreviver. Estaremos encaminhando o corpo de seu filho e mais tarde enviaremos o dinheiro de indenização.
- Então é assim? Meu filho pode ser subistituído? Ele morre e vocês fazem nada? E eu ia morar com ele e com meu neto que estava para nascer.
- Sinto muito, não fui eu...
Alex desmaia.

Sua filha entra em casa e o acode, o pai fala para ela que o irmão morreu, ela já sabia. O corpo havia chegado na casa dela por volta das quatro da tarde, e ela não tem coragem de fazer nada.
O homem, então, vai até o espelho, olha-se nele. Agora ele tem o rosto de seu filho. Seu maravilhoso filho que se foi. Olha-se no espelho e o vê cantando e gritando o hino de seu amado clube. O ouve tocando a melodia no violão. O vê escancarado na porta, exibindo seu bom futebol para sua namorada...
e ele sorri, e então decide morrer. Por que a dor é insuportável. Não seria tão simples se os pais morressem antes? E se os filhos deixassem um legado maravilhoso para os próximos? Mas dois sonhos foram interrompidos.
E o Alex se lembra do livro que leu. Torna-se observador inacessível de tudo que a vida proporciona. Nada, nada nem ninguém conseguirá trazer de volta o seu filho. E ele sofre. Chora, pede, implora.
Sua esposa não vem mais visitá-lo e, depois do enterro, ele não viu de novo seus outros filhos.
Nem a menina, nem o prefeito.

O homem então olha-se no espelho e decide ir.
Fecha os olhos, deita-se ao chão, e dali liga para seu filho, ocupado. O filho não pode atendê-lo e então ele pede para deixar uma mensagem.
- Eu te amo, meu filho!
E liga para a caçula.
- Eu te amo, minha filha!
E deita-se ao chão esperando que alguém o viesse buscá-lo.
E como se fosse mágica, sua esposa canta. Ele a observa no corredor, vindo em direção dele. E atrás dela o filho, quando criança. Os dois se abraçam. Ele a beija. Pega o menino nas costas e os três vão embora...
Sobem aos céus para nunca mais sofrerem.
Ele, com a aparência jovial, maravilhosa.
Ela com a aparência magnífica de outrora.
E o filho voltando a ser criança, em uma infância interrompida.




E ao longe, o sol dispunha ao horizonte.

Friday, June 01, 2007

At.. Sê...

Sê...
(Nayguel Cappellari)

Se meus olhos pudessem te ver.
[E se minhas mãos pudessem te tocar].
Se minha voz pudesse bradar tão alto.
Inquieto. Imóvel. Inerte...

Lúgubre é o meu céu.
Enquanto não te tenho aqui, rosa minha.
Se eu pudesse te ouvir falando.
E se eu pudesse te abraçar fortemente...

Se tudo não fosse tão estranho...
[- Imagine se a distância não existisse. ]
Logo, tudo mais perfeito. Mais lindo. Mais...

Se eu pudesse ver o teu sorriso.
E se eu pudesse amar-te livremente...
[Sem que fosse tudo minha mera imaginação].





Meros devaneios de poeta tolo que jamais enxergará toda a verdade no mundo.